A vida actual, para ser automona e independente, tem de ser remodelada. A
nação tem de emendar erros profundos e numerosos, accumulados durante muitos
annos de imprevidencia, de egoismo, de maus governos e de corrompidos costumes
publicos. Esta situação é tanto mais grave, quanto gradualmente se foi
estabelecendo entre a nação e os governantes um verdadeiro divorcio, divorcio
ha muito latente e que a crise actual veio apenas patentear em toda a sua cruel
realidade. Os governos, em Portugal, deixaram ha muito de representar
genuinamente os interesses e o sentir da nação. Nem por isso, porém, a acção da
«Liga» será revolucionaria. Pelo contrario, a «Liga» considera um tal divorcio
como uma calamidade, e a sua acção tenderá a restabelecer a natural harmonia
entre o pensamento nacional e o seu orgão, o Estado. Fóra das competições da
falsa politica, que nos tem dividido e enfraquecido, mas por isso mesmo no
terreno da verdadeira politica, que é a dos grandes interesses nacionaes, fóra
dos partidos, porque superior a elles, a «Liga» fará ouvir aos poderes publicos
a voz da nação: e essa voz persistente, firme e cheia de auctoridade
obrigal-os-ha, por muito inveterado que seja o seu endurecimento, a
converterem-se á sua verdadeira missão, que é a dos representantes e zeladores
dos interesses da nação, e não só dos interesses materiaes, mas dos mais
elevados, os interesses moraes, e entre estes preeminentemente o da dignidade
nacional. A moralisação dos poderes publicos, tal é a primeira condição do
renascimento e integridade da vida social portugueza.
Pasmem-se. Estas palavras foram escritas por Antero de Quental em 1890 aquando da tomada de posse como Presidente da Liga Patriótica do Norte. É simplesmente incrível a actualidade destes pensamentos e a lucidez e clarividência deste português.

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