quinta-feira, 3 de novembro de 2011

1890 ...

A vida actual, para ser automona e independente, tem de ser remodelada. A nação tem de emendar erros profundos e numerosos, accumulados durante muitos annos de imprevidencia, de egoismo, de maus governos e de corrompidos costumes publicos. Esta situação é tanto mais grave, quanto gradualmente se foi estabelecendo entre a nação e os governantes um verdadeiro divorcio, divorcio ha muito latente e que a crise actual veio apenas patentear em toda a sua cruel realidade. Os governos, em Portugal, deixaram ha muito de representar genuinamente os interesses e o sentir da nação. Nem por isso, porém, a acção da «Liga» será revolucionaria. Pelo contrario, a «Liga» considera um tal divorcio como uma calamidade, e a sua acção tenderá a restabelecer a natural harmonia entre o pensamento nacional e o seu orgão, o Estado. Fóra das competições da falsa politica, que nos tem dividido e enfraquecido, mas por isso mesmo no terreno da verdadeira politica, que é a dos grandes interesses nacionaes, fóra dos partidos, porque superior a elles, a «Liga» fará ouvir aos poderes publicos a voz da nação: e essa voz persistente, firme e cheia de auctoridade obrigal-os-ha, por muito inveterado que seja o seu endurecimento, a converterem-se á sua verdadeira missão, que é a dos representantes e zeladores dos interesses da nação, e não só dos interesses materiaes, mas dos mais elevados, os interesses moraes, e entre estes preeminentemente o da dignidade nacional. A moralisação dos poderes publicos, tal é a primeira condição do renascimento e integridade da vida social portugueza.
Pasmem-se. Estas palavras foram escritas por Antero de Quental em 1890 aquando da tomada de posse como Presidente da Liga Patriótica do Norte. É simplesmente incrível a actualidade destes pensamentos e a lucidez e clarividência deste português.

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